terça-feira, 27 de agosto de 2013

As discussões de projetos na Câmara - o debate político e a legalidade

Por Paulo Eduardo Malerba

Reunião da Comissão de Justiça e Redação 2013-2014, na Câmara de Jundiaí

Como costuma-se lembrar, a Câmara Municipal é uma casa política e não técnica. No entanto, pouco se utiliza dos instrumentos políticos da Casa. Um vereador é um aglutinador de determinadas preferências sociais, capaz de mobilizar e debater muitas temáticas. Para isso, ele dispõe de uma flexibilidade maior do que a Sessão Ordinária para usar o mandato como instrumento de debate e mobilização sobre muitos assuntos que - mesmo não se tornem lei por sua iniciativa direta - podem justamente promover o que os projetos ilegais muitas vezes não conseguem: a discussão e organização social numa pauta definida. A saída de produzir muitos projetos ilegais parece ir no sentido contrário: ao buscar uma saída técnica, ou seja, a criação de uma nova lei que será inaplicável, muitas vezes não se fomenta e nem se amplia o debate político”.

Um tema que não é novo mas que sempre retorna à discussão nas legislaturas da Câmara Municipal é em relação à iniciativa e legalidade nos trâmites das proposituras dos vereadores. Ou seja, se mesmo sendo inconstitucional elas devem seguir e ser discutidas em plenário, tornando-se lei, apesar de serem passíveis de questionamento jurídico posteriormente e que, no final, sua eficácia como norma seja nenhuma.


O tema decorre do fato da Câmara Municipal não ter competência para legislar sobre todos os assuntos. As leis são elaboradas em três esferas - Municipal, Estadual e na União -, bem como em dois diferentes poderes, legislativo e executivo, em alguns casos também no judiciário. Algumas matérias são privativas da União, não cabendo leis municipais, por exemplo, no direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, direito do trabalho; bem como sobre energia, telecomunicações, radiodifusão, serviço postal, propaganda, entre vários outros, todos destacados no art. 22 da Constituição Federal (CF).

Sem se alongar no aspecto jurídico do assunto, o que observamos é que existe uma primazia da Constituição Federal, que deve ser considerada em todas as esferas do poder público. A liberdade de legislar do vereador é limitada: deve-se ater aos temas de interesse local, que não colidam com matérias privativas da União e dos Estados e que não criem gastos extra-orçamentários ao Executivo, nem criem atribuições ou busquem intervir na gestão da administração pública.

Neste sentido, podemos discordar do sistema legal, da forma como foi constituído, de seu funcionamento, no entanto, é a regra que existe para funcionamento das Instituições no atual sistema político-legal brasileiro. A democracia tem suas regras, caso contrário não se manteria como regime de governo. Dentre elas temos a regularidade das eleições, a alternância no poder, a aceitação da decisão tomada pela maioria, os instrumentos legais para concepção de novas regras, etc. A Câmara Municipal se insere neste contexto, ela funciona a partir de regras, de normas, de leis. Está submetida tanto à CF quanto à Constituição Estadual e a Lei Orgânica, bem como ao seu próprio Regimento Interno. Uma nova propositura não prosperará se não for elaborada de acordo com todos estes regramentos.

O principal argumento utilizado para se discutir um projeto de lei considerado ilegal no âmbito da Câmara Municipal é a importância da matéria apresentada, isto é, ela encontra-se amparada num desejo da comunidade e que, embora não possa tornar-se lei por iniciativa do vereador, merece ser discutida na Câmara e levada ao conhecimento do Executivo, que em muitos casos teria a iniciativa legal da propositura. Como norma jurídica não terá valor, pois não será aplicável, no entanto, segundo muitos, cabe discutir o tema.

Este argumento tem parecido falho por dois aspectos, o primeiro é que normalmente boa parte das discussões de leis na Câmara Municipal ficam restritas ao seu ambiente, exceto quando possuem um impacto significativo na vida da comunidade, como as peças orçamentárias e normas que criem novas obrigações ou direitos aos cidadãos. Quando já partem com vício de iniciativa e nenhuma chance de prosperar como lei, geralmente não são recebidas com grande entusiasmo, tampouco recebem atenção. Logo não cumprem o papel de propiciar um amplo debate social. Uma segunda razão é que a grande parte delas não dialogam com o Poder Executivo no sentido de “sensibilizá-lo” para o tema. O processo torna-se estritamente burocrático, a Câmara aprova um projeto, ele vai ao Prefeito e retorna com veto, posteriormente mesmo se a Câmara derrubar o veto, a lei não se aplica e, via de regra, é anulada por uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).

Por isso, cabe pensar se a apresentação de novas proposituras, mesmo que ilegais, fortalecem ou não a Câmara, se de fato a posiciona diante de temas importantes para a sociedade. Ou se, pelo contrário, não a tornam alvo de reprovação social ao não produzir leis que sejam viáveis. Os vereadores não possuem como alternativa apenas novas leis para discutir um tema importante para a sociedade. Como costuma-se lembrar, a Câmara Municipal é uma casa política e não técnica. No entanto, pouco se utiliza dos instrumentos políticos da Casa. Um vereador é um aglutinador de determinadas preferências sociais, capaz de mobilizar e debater muitas temáticas. Para isso, ele dispõe de uma flexibilidade maior do que a Sessão Ordinária para usar o mandato como instrumento de debate e mobilização sobre muitos assuntos que - mesmo não se tornem lei por sua iniciativa direta - podem justamente promover o que os projetos ilegais muitas vezes não conseguem: a discussão e organização social numa pauta definida. A saída de produzir muitos projetos ilegais parece ir no sentido contrário: ao buscar uma saída técnica, ou seja, a criação de uma nova lei que será inaplicável, muitas vezes não se fomenta e nem se amplia o debate político.

De que forma um vereador, fora da Sessão Ordinária, pode criar o debate político e avançar numa pauta sobre determinado tema? Usando seu mandato para realizar encontros, fóruns, congressos, plenárias, potencializando as Comissões Permanentes da Câmara, estabelecendo debates com método junto às comunidades, escrevendo, produzindo discussões em vários âmbitos, dentre outros. Imaginar que o papel do vereador limita-se à Sessão e a apresentação de novas proposituras é limitar demasiadamente suas funções, que além de técnicas, como fiscalizar o Executivo e legislar, tem um grande alcance no diálogo social e político.

Para saber como funciona o trâmite de um  projeto na Câmara de Jundiaí, preparei um resumo: clique aqui e acesse o artigo


Um comentário:

hel disse...

Excelente! Compartilhando agora.